1. Uma empresa é feita de pessoas.

Todas, do fundador ao zelador, estão de passagem.
Todas, segundo se faz crer, são substituíveis. Mas a substituição de algumas é bem mais impactante do que a de outras.
Daí a necessidade de um bom planejamento sucessório para os sócios, e de uma boa tática de retenção para colaboradores estratégicos.
Como estratégias de retenção, surgiram os Incentivos de Longo Prazo (ILPs).

2. As empresas brasileiras têm utilizado três modalidades de ILPs.

  1. Opções de Compra de Ações (Stock Options);
  2. Phantom Stocks;
  3. SARs

Somente a primeira é sustentável sob os aspectos tributário, trabalhista e empresarial.

3. Os planos de Stock Options conferem aos beneficiários o direito de, em momento futuro, adquirirem ações da companhia pelo preço definido no momento da concessão do benefício (strike price).

Se houver valorização da companhia durante o período mínimo que deve transcorrer para o exercício da opção (vesting period), o beneficiário terá uma vantagem evidente: comprará ações por um preço inferior ao seu valor econômico.

E, desta forma, gera-se um incentivo não só a que este colaborador permaneça na companhia, como também a que ele trabalhe visando à elevação do valor da empresa.

4. Nas Phantom Stocks não há aquisição de ações. Após o cumprimento das condições fixadas no plano (que podem incluir prazo e metas), concedem-se ao beneficiário, sem o pagamento de qualquer preço, direitos inerentes aos de um acionista (em especial, distribuição de dividendos e recebimento do valor de valorização das ações). Não há um vínculo societário formal, mas uma ficção criada entre as partes.

5. A diferença entre as Phanton Stocks e as SARs é que, nestas, não se mantém a ficção do vínculo societário por um período posterior ao do exercício. Apura-se a valorização do valor econômico da companhia durante o período transcorrido entre a concessão e o exercício (período de vesting) e se faz o pagamento deste valor no mesmo ato. Algo parecido com uma compra e venda de ações no mesmo momento.

6. O beneficiário de uma Stock Options não ganha dinheiro no momento da concessão. Ganha apenas a expectativa de um ganho futuro.

Também não ganha dinheiro no momento do exercício das opções (após o vesting). Ao contrário, neste momento ele faz um desembolso em favor da companhia (pagando o preço de emissão das ações que está adquirindo).

Como acionista, o beneficiário receberá dividendos (que são isentos de tributação) e poderá receber o valor econômico de suas ações, quando de sua liquidação (por meio do resgate pela companhia ou da venda, a acionistas ou a terceiros).

O valor de liquidação não é tributado como salário ou pro labore. É tributado como ganho de capital (cuja base de cálculo é a diferença entre o valor de liquidação das ações e o valor pelas mesmas pago no momento do exercício das opções). Esta é uma tributação substancialmente mais baixa do que a incidente sobre pagamentos de natureza trabalhista, ou mesmo sobre o pro labore¹.

7. É fácil perceber que nos planos de Stock Options existe uma operação de natureza empresarial (na qual o beneficiário, por decisão pessoal, coloca capital a risco; ou seja, compra ações para depois revendê-las, sujeito às varações de mercado).

Nas operações de Phantom Stocks e de SARs não está presente a natureza empresarial. Não há risco. Existe incerteza, na medida em que o beneficiário não sabe se haverá ganhos após o vesting (a companhia pode não se valorizar neste período). Mas não há risco, na medida em que não há possibilidade de o beneficiário sofrer perdas (ele não paga nada; nem no momento da concessão nem no do exercício do ILP).

Em razão da inexistência de risco (e, portanto, da ausência de uma característica essencial dos contratos empresariais), o CARF tem decidido, com acerto, que os ganhos obtidos por meio da liquidação de Phantom Stocks ou de SARs não podem ser tributados como ganho de capital, mas sim como receita tributável (trabalhista, contratual ou pro labore, a depender da relação contratual existente com o colaborador).

8. Um plano de Stock Options é estruturado por meio de um regulamento (que usualmente não é levado a registro na Junta Comercial).

Os pontos centrais do plano são o preço de exercício e as condições precedentes.

O preço de exercício (strike price) é o valor de emissão das ações a ser pago no momento em que o beneficiário puder, e quiser, converter suas opções em ações. É da essência dos planos de stock options que o preço de exercício represente o valor econômico da empresa no momento da outorga das opções.

Condições precedentes (vesting) são os requisitos que devem ser reunidos para que o beneficiário possa converter suas opções em ações, por meio do pagamento do strike price.

A condição precedente essencial é a temporal (vesting period). Esta condição pode ser direta (straight vesting), com data determinada (cliff vesting), por metas de desempenho (performance vesting) ou em etapas (step vesting).

É comum nos plano de ILP a utilização de um vesting de três anos, de forma direta ou parcelada. Períodos maiores não são necessariamente mais eficientes, na medida em que um cenário muito distante de realização dos benefícios econômicos atrelados ao plano pode representar desmotivação ao beneficiário.

Na busca pela retenção, uma solução que tem sido cada vez mais adotada é a atribuição das opções não de uma só vez, mas sim em tranches periódicas, de forma que o beneficiário possa sempre (ou durante todo o período de interesse da companhia) vislumbrar a possibilidade de exercício futuro de um lote de opções.

Também é comum encontrar em planos de stock options a previsão de antecipação do vesting em caso de evento de liquidez da companhia (sendo a venda da empresa o evento de liquidez mais comum). Esta é uma estratégia de motivação de gestores que, diante de um cenário de mudança de controle da companhia, podem ver ameaçado seu futuro como executivos. Em alguns casos, este temor poderia mesmo levar tais executivos a não colaborar da melhor forma nas etapas do processo de M&A, o que pode frustrar o interesse dos acionistas no evento de liquidez. A antecipação do vesting gera um alinhamento de interesses, o que tende a elevar o empenho dos executivos envolvidos para que o fechamento da operação ocorra da melhor forma possível.

9. O regulamento rege as reações entre companhia e beneficiário até o momento do exercício. Após a conversão das opções em ações, a relação passa a ser societária, e será regulada pelo estatuto social e pelo acordo de acionistas (cuja adesão é usualmente listada como condição para o exercício das opções).

A principal disposição deste acordo de acionistas são as condições para a venda das ações. Para manter o risco (e, portanto, para evitar a descaracterização da natureza empresarial do plano) é usual indicar que o resgate das ações por ato de vontade do acionista será feito por valor variável, a depender do tempo de manutenção da propriedade das ações. Por exemplo, pode-se estipular no acordo de acionistas que se o acionista solicitar o resgate em até seis meses a contar do exercício das ações, o valor de resgate será equivalente ao strike price.

10. Os planos de Stock Options são típicos de sociedades anônimas. Somente nelas é possível a previsão estatutária de um capital autorizado, essencial para que o direito de exercício da opção seja líquido (ou seja, não dependente da manifestação livre de vontade de outra pessoa). No mecanismo de capital autorizado, as deliberações de aumento de capital social são tomadas pelo conselho de administração. Os conselheiros, como administradores, não têm voto livre, na medida em que são obrigados a dar cumprimento aos atos sociais (entre os quais está o regulamento de ILP). Seu voto, nesta matéria, é vinculado. Se houvesse a necessidade de uma deliberação dos sócios, estes poderiam simplesmente deixar de aprovar o aumento de capital social (na medida em que o voto dos sócios é livre, desde que não seja abusivo ou conflitante – o que somente ocorreria se houvesse demonstração de vantagem pessoal direta ao sócio em prejuízo da sociedade).

Nas sociedades limitadas (nas quais não é possível a estipulação de capital autorizado, de forma que o aumento de capital depende de deliberação dos sócios), é possível estruturar direitos de aquisição de quotas. Mas estes direitos seriam oponíveis ao sócio concedente (e não à sociedade), o que retira parte de sua liquidez.

11. Respeitada a estrutura jurídica (especialmente no plano tributário e no da liquidez do direito de exercício), as opções de compra de ações são um instrumento de gestão de pessoas apto à geração de expressivos resultados, especialmente no sentido do alinhamento de interesses entre sócios e colaboradores.

¹ Para pessoas físicas, o IR sobre o ganho de capital é de 15% sobre os ganhos de até 5 milhões de reais, de 17,5% sobre a parcela entre 5 e 10 milhões de reais, de 20% sobre a parcela entre 10 e 30 milhões de reais e de 22,5% sobre a parcela excedente a 30 milhões de reais.