Agentes econômicos com interesses comuns podem construir diferentes relações jurídicas. Muitas são típicas, com regime jurídico próprio e regras específicas. Em outras, há coordenação administrativa e dependência econômica entre os agentes, sem que, contudo, as partes tenham formalizado e registrado uma estrutura societária típica. Nestes casos (e especialmente para fins de regular eventual responsabilidade solidária entre os agentes econômicos envolvidos), pode estar caracterizado um grupo econômico.

Grupos econômicos não são estruturas formais. Não comportam constituição na Junta Comercial. São essencialmente fáticos. Sua regulação jurídica está principalmente no §2° do art. 2° da CLT:

Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego”.

A função da lei é evidente: nos casos em que se verifica uma relação econômica, sem que haja uma estrutura jurídica típica, pode-se identificar um grupo econômico. E, neste caso, pode-se aplicar o disposto no §2° do art. 2° da CLT. Já se houver uma figura societária típica, seu regime legal deve ser respeitado, sob pena de extinção de todas as figuras societárias no direito brasileiro (que seriam singelamente substituídas pelos grupos econômicos).

Não é possível, nem lógico, que uma mesma estrutura jurídica possa, ao mesmo tempo, ser qualificada como uma das muitas figuras jurídicas típicas e como um grupo econômico. Não há como sobrepor dois regimes jurídicos. E, como é evidente, o regime específico se sobrepõe ao genérico e residual.

Consórcios são estruturas societárias típicas. Constituem-se formalmente perante a Junta Comercial. Estão sujeitos a um regime jurídico próprio, cuja norma central é aquela que prevê que as sociedades consorciadas são independentes, inexistindo qualquer vínculo de solidariedade que obrigue uma delas a pagar obrigações de outra. É o que prevê o art. 278 da LSA:

“Art. 278. As companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento, observado o disposto neste Capítulo.

§1º O consórcio não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade.

§2º A falência de uma consorciada não se estende às demais, subsistindo o consórcio com as outras contratantes; os créditos que porventura tiver a falida serão apurados e pagos na forma prevista no contrato de consórcio.”

Ou seja: quando há consórcio, não há solidariedade entre as empresas. Já quando há coordenação administrativa ou dependência econômica entre empresas, em relação informal (provavelmente objetivando esvaziar patrimônios específicos para frustrar o interesse de credores) aplica-se, para fins de responsabilidade trabalhista, o disposto no §2° do art. 2° da CLT.

A única exceção da lei está no art. 33, V, da Lei 8.666/93. Nas obrigações relativas aos contratos administrativos impõem-se o vínculo de solidariedade. Fora do âmbito do contrato administrativo, prevalece a regra da autonomia patrimonial entre as sociedades.

O resultado da interpretação de tais normas deveria ser simples e direto. Mas não tem sido. Sobram decisões judiciais impondo ampla solidariedade entre as sociedades consorciadas. Tais decisões são comuns no âmbito trabalhista. E estão erradas.

Salvo se estivesse demonstrado que os colaboradores tinham vinculo de subordinação direta com as demais empresas consorciadas, não haveria como responsabilizá-las.

Para responsabilizá-las solidariamente, seria necessário identificar uma relação fática que se sobrepusesse à relação jurídica decorrente da contratação do consórcio. Este cenário estaria presente se a relação material entre as empresas envolvidas indicasse claramente que, mesmo sem o consórcio, as atividades continuariam a ser desenvolvidas de forma coordenada por diferentes empresários. Ou seja: haveria uma primazia da realidade sobre a forma.

No mais das vezes, as empresas consorciadas agem de forma independente e complementar, para que seja possível a execução um contrato complexo, que depende do somatórios de competências que normalmente não estão reunidas em uma só empresa.

A jurisprudência brasileira, contudo, tem adotado uma solução simplista: entender que em todo consórcio há um grupo econômico. E assim, ignora-se não só a lei, como também o fato de que, no mais das vezes, os consórcios não são instituídos como ato de vontade absoluta das partes, mas simplesmente como forma de atender ao interesse público em contratos administrativos de maior complexidade.

Mas, recentemente, o TST julgou a matéria de forma mais técnica, o que pode significar uma mudança positiva. Na decisão (RR-2862-24.2014.5.02.0049, com acórdão publicado em 22/03/19), reconheceu-se que os consórcios têm regime jurídico próprio, não sendo aplicável o regime residual dos grupos econômicos quando estiver presente a relação de hierarquia. Vale a transcrição da ementa:

“RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.015/2014. GRUPO ECONÔMICO. SOLIDARIEDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE HIERARQUIA ENTRE AS EMPRESAS DO CONGLOMERADO. O Tribunal Regional manteve a condenação solidária da Reclamada ao fundamento de que a constatação da existência de sócios em comum e da relação de coordenação entre as empresas revelavam-se elementos suficientemente aptos à caracterização de grupo econômico. Todavia, esta Corte, interpretando o artigo 2°§ 2°, da CLT, pacificou o entendimento de que a mera existência de sócios em comum e de relação de coordenação entre as empresas não constituem fatores suficientes para a configuração de grupo econômico, revelando-se imprescindível a existência de vínculo hierárquico entre elas, isto é, de efetivo controle de uma empresa líder sobre as demais. Julgados da SbDI-1 e de Turmas. Assim, ao manter a responsabilidade solidária da Recorrente com amparo no reconhecimento da existência de grupo econômico, configurado a partir da relação de coordenação entre as empresas reclamadas e de sócios em comum, o Tribunal Regional procedeu à interpretação do artigo 2°§ 2°, da CLT dissonante da consolidada no âmbito desta Corte Superior, o que impõe o provimento do recurso de revista para, afastada a caracterização de grupo econômico, absolver a Recorrente da responsabilidade solidária pelo pagamento das verbas trabalhistas reconhecidas na presente reclamação trabalhista. Recurso de revista conhecido e provido.”

A decisão restaura não só a lei. Restaura um pouco do ambiente negocial brasileiro, pressionado por uma imensa quantidade de riscos severos, injustificáveis e inadministráveis.